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O VOO MAIS ALTO QUE A DOR NÃO IMPEDIU

Uma Crônica para Mário Barbedo

João Pessoa, 03 de maio de 2025

 

Walber Rufino1

 





Há nomes que os livros registram. E há outros que a vida inteira se encarrega de escrever na gente. Mário Barbedo nasceu no Rio de Janeiro, numa manhã de 3 de maio de 1885. E se a gente pudesse escutar os sinos daquele tempo, talvez ouvisse um aviso de que ali não chegava apenas um menino — mas alguém que daria muito de si ao Brasil, à Paraíba, aos céus e à justiça. Alguém que ofereceria até o próprio corpo — e faria isso sem reclamar.

Cresceu cercado de disciplina, mas não daquela que se impõe pelo grito. Era da disciplina que nasce do exemplo. Da firmeza que ensina. E do silêncio que forma. Desde cedo, a farda tornou-se sua segunda pele. Não demorou a entrar no Exército, onde o brilho do que era invisível começou a ser notado: a capacidade de servir sem se exibir, de comandar sem humilhar, de transformar sem precisar ser chamado de herói.

Em 1912, ainda jovem, foi enviado à Paraíba para reorganizar sua força policial. E lá fez o que poucos fariam: construiu um regulamento justo, implantou concursos públicos para impedir indicações políticas, criou escolas para alfabetizar soldados — porque acreditava, de verdade, que ninguém serve bem se não for bem formado. Criou inspetorias no interior, levou o primeiro automóvel à corporação, montou a primeira seção de bombeiros. E, mesmo ficando apenas dois anos, parece que ficou por décadas.

Não queria palmas. Queria coerência.

Quando a política mudou e a honestidade ficou desconfortável, entregou o cargo e voltou para o Exército. Foi aí que seus olhos se voltaram para o céu. Num tempo em que o Brasil ainda engatinhava na aviação militar, Mário foi estudar na França. Tornou-se um dos primeiros aviadores do país.

E, ao retornar, tornou-se instrutor no Campo dos Afonsos. Treinou jovens oficiais para voar, sonhar e resistir à gravidade — não apenas do ar, mas da vida.Até que um dia, o avião caiu. E o homem que tanto levantou os outros já não pôde mais se levantar.

Tetraplégico, passou os últimos anos entre hospitais e memórias. Mas nem assim se rendeu ao lamento. Quando quiseram promovê-lo por dó, ele recusou. Escreveu uma carta linda, pedindo que o benefício fosse transformado em uma lei geral — para proteger todos os aviadores, não apenas ele.

Isso é raro.

Isso é imenso.

Isso é Mário Barbedo.

Faleceu em dezembro de 1928, aos 43 anos. Tão cedo. Mas quem mede a vida pelo tempo — e não pela profundidade — talvez nunca entenda o que é ser eterno.

Hoje, ao lembrarmos seus 140 anos de nascimento, não falamos de datas. Falamos de legado. De memória. Daquela espécie de grandeza que é tão serena que quase passa despercebida — mas, quando você percebe, é tarde demais: ela já te mudou.

 

E foi isso que Mário Barbedo fez.

 

Mudou a Polícia Militar da Paraíba.

Mudou a formação dos praças.

Mudou o Exército Brasileiro.

Mudou a aviação militar.

Mudou o que significava servir.

E mesmo paralisado, continuou elevando os outros.

Porque há homens que precisam voar para tocar o céu.

E há os que, mesmo caídos, continuam alçando todos à sua volta.

 

Mário Barbedo foi dos segundos.

 

 

 

Referências bibliográficas

1.        Academia de Letras dos Militares Estaduais da Paraíba (ALMEP). Dossiê biográfico do patrono da Cadeira nº 4, Mário Barbedo.

2.        Blog “A Briosa: História da Polícia Militar da Paraíba”, artigos sobre a gestão de Barbedo (1912–1914).

3.        Documentos internos da PMPB: Regulamento Geral da Força Pública (1913).

4.        FamilySearch, ID: G835-BRX. Dados vitais, casamento e árvore genealógica. Acesso em 24 abr. 2025. https://www.familysearch.org/tree/person/details/G835-BRX

5.        Jornal Crítica, Rio de Janeiro, edições de maio a dezembro de 1919.

6.        Registro de casamento, 27 de dezembro de 1913, Igreja de Nossa Senhora da Glória, Rio de Janeiro. Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro. FamilySearch. Image Group Number: 004003292.

7.        Revista da Força Aérea Brasileira. Histórico da aviação militar no Brasil.

8.        JOÃO PESSOA & PB FOTOS ANTIGAS. Panorâmica do Quartel da Força Policial na Praça Pedro Américo. Facebook. Disponível em: https://www.facebook.com/joaopessoapbfotosantigas. Acesso em: 25 abr. 2025.

 

Este texto integra o acervo comemorativo dos 140 anos de nascimento de Mário Barbedo, patrono da Cadeira nº 4 da ALMEP.

 

 

 

 

 

1 — José Walber Rufino Tavares. Presidente da Academia de Letras dos Militares Estaduais da Paraíba. ALMEP, Cad. 01; Vice-presidente da Academia de Letras dos Militares Estaduais do Brasil e do Distrito Federal. ALMEBRAS, Cad. 22; e Membro Correspondente do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil. IGHMB, Cad. 14.





 
 
 

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